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Diretor: Paulo Menano

Opinando: “A Política Portuguesa sob o Olhar de Platão: Entre a Arte e a Farsa”


“No ciclo atual, o universo está abandonado pelos deuses, e cabe aos humanos, guiados por políticos sábios, manter a ordem e a harmonia.”

                                                   Platão, O Político, 269c-274e

 

Platão, na sua obra O Político, apresenta uma visão clara do que deveria ser a verdadeira arte de governar. O filósofo grego descreve o político ideal como um tecelão da sociedade, alguém que harmoniza diferenças, aplica o conhecimento à realidade e governa para o bem comum. No entanto, ao olharmos para o panorama político português, parece evidente que estamos mais próximos da caricatura do sofista do que do verdadeiro governante.

Os políticos portugueses, na sua maioria, não exercem a governança como uma ciência, mas sim como um jogo de retórica e interesses que visam esmifrar. Platão alertava contra aqueles que governam sem conhecimento, apenas manipulando discursos para enganar o povo. Hoje, vemos um cenário onde promessas vazias e decisões tomadas ao sabor das sondagens substituem a verdadeira arte da política.

A metáfora do tecelão, utilizada por Platão para descrever o governante ideal, torna-se quase uma ironia no contexto da procissão política portuguesa. Ao invés de unir e equilibrar a sociedade, os políticos parecem mais interessados em dividir, alimentando narrativas polarizadoras e fragmentando o tecido social em prol de ganhos eleitorais. A busca pelo consenso e pelo bem comum dá lugar ao clientelismo, ao nepotismo e à defesa de interesses partidários.

Outro ponto essencial da obra de Platão é a crítica à rigidez das leis quando estas não são aplicadas por governantes sábios. Em Portugal, as leis servem os interesses de quem tem mais recursos, enquanto a justiça parece ser cega apenas para os mais frágeis. A impunidade dos delírios políticos, a mentira, o ocultar, os escândalos financeiros e a apodrecimento são evidências claras de que as leis não são suficientes se os políticos não possuírem virtude e conhecimento.

Platão distingue entre governos justos e corruptos, não pela sua estrutura, mas pela intenção dos seus líderes. Uma democracia, segundo ele, pode ser tão injusta quanto uma tirania se os governantes forem incompetentes ou egoístas. Em Portugal, a democracia muitas vezes serve como escudo para a mediocridade, onde eleições não garantem necessariamente líderes sábios, mas sim aqueles que melhor manipulam a opinião pública.

O filósofo grego também sublinha o papel do político como educador, alguém que molda os cidadãos para a virtude. No entanto, o sistema político português parece investir na desinformação, no sumiço do dinheiro, no aumento de impostos e no conformismo, em vez de estimular o pensamento crítico e a participação ativa da sociedade. O resultado? Um eleitorado desiludido, conformista, nada exigente, descrente e frequentemente refém do menor dos males nas urnas.

Por fim, Platão defende que o verdadeiro político deve governar com base no saber e na virtude, algo que parece utópico no contexto atual. O espetáculo da política portuguesa é dominado por táticas eleitorais, chico-espertice, obscurantismo, gulosice, discursos demagógicos, velhacaria silenciosa e um pragmatismo cínico que substitui qualquer resquício de idealismo.

Se Platão estivesse vivo hoje e analisasse a política portuguesa, provavelmente concluiria que estamos longe de um governo baseado na arte e no conhecimento. Em vez disso, vivemos uma ligeira representação hilariante, assente numa realidade que mistura a incapacidade para a comédia e a complexidade da política, onde o verdadeiro político – aquele que governa para o bem comum – é uma espécie em extinção. Talvez o maior desafio da nossa democracia não seja apenas escolher entre partidos, mas sim encontrar verdadeiros políticos, no sentido platónico do termo.

Carlos M.B. Geraldes, PhD.