
Opinando: “Fazedora de Vontades” de Sandra Maria Correia
Fazedora de Vontades
Comemorado a 19 de novembro, o Dia Mundial do Empreendedorismo Feminino, data criada em 2014 pela Organização das Nações Unidas (ONU) para evidenciar e valorizar as mulheres como protagonistas no campo empresarial. Sendo uma iniciativa das Nações Unidas, visa combater a desigualdade de género, ainda tão presente no mercado de trabalho e no mundo. Não consigo dissociar esta data do dia 8 de março, Dia Internacional da Mulher, proclamado, também pela ONU, em 1977. Os 37 anos que separam as duas efemérides espelham a evolução do papel das mulheres na sociedade, a sua afirmação no mundo empresarial, mas em outras áreas como na política, na ciência, no direito, tão marcadamente masculinas, no passado.
Portugal foi eleito o 6º melhor país para mulheres empreendedoras, ficando atrás de países como Nova Zelândia, Suécia, Canadá, Estados Unidos e Singapura, num estudo que analisou 57 países, o que nos deixa orgulhosamente empoderadas.
A conferência promovida pelo Nerga em colaboração com o Município de Fornos de Algodres e o CLDS 4G, no dia 19 de novembro, espelhou esta noção de empoderamento da mulher. O salão nobre esteve repleto de mulheres que têm a consciência da sua independência e liberdade para serem quem elas são, de quererem ser, agir, amar e de gozarem das mesmas oportunidades que os homens têm na sociedade, não se deixando intimidar por padrões impostos.
A palavra empreendedorismo remete para o mundo empresarial, é certo. Se houve um momento da nossa história, em que vimos as mulheres arregaçar mangas e enfrentar a crise, foi no confinamento da era Covid. Muitas utilizaram as redes sociais para promover o seu negócio. Não pararam. Foram horas e horas à frente de um ecrã, foram milhares de posts criados para publicitar os seus produtos, venderam e venceram.
No entanto, ao ouvir o debate, dei por mim a refletir sobre a palavra empreendedorismo no “feminino”. Não seremos todas empreendedoras? Não tivemos todas um sonho? Um sonho que virou uma vontade? Não seremos todas “Fazedoras de vontades”? Pegando no verso de Fernando Pessoa “Deus quer, o homem sonha, a obra nasce”, eu afirmaria que “A mulher sonha, a vontade cresce, a obra nasce”. A nossa determinação, a nossa resiliência e persistência são as ferramentas que fazem crescer o poder da mulher no mundo. Basta querer. Não há constrangimentos que nos podem negar a nossa afirmação, na sociedade: somos mães, somos filhas, somos esposas, somos profissionais, somos cidadãs. Querem maior empreendedor do que uma mulher, ao longo de toda a sua vida?
Nem tudo é rosa ou colorido. O dia 19 de novembro e o dia 8 de março relembram que, apesar de paulatinamente termos ganho terreno na sociedade, ainda há muitas e muitas mulheres que se escondem atrás do medo, mulheres que não têm coragem, mulheres dominadas, violentadas, mulheres silenciadas, no mercado do trabalho e no lar. Ainda que tenhamos mudado o rumo, ainda navegamos em marés muito incertas, ainda não somos valorizadas, na política, nomeadamente, por aquilo que somos e fazemos, pelas nossas competências de fazer acontecer. A política continua a ser dominada e pensada por homens, seja nas Juntas de Freguesia, nas Câmaras Municipais ou no Parlamento. Rejubilar pelos 30% de mulheres presentes na Assembleia da República parece-me pensar pequenino. Obviamente que não apelo a um domínio de mulheres no parlamento, mas gostaria de pensar que, quem nos representa, foi escolhida não por ser mulher, mas por ser cidadã, como verificamos em tantas Juntas de Freguesia. Aliás, Fornos de Algodres tem, apenas, uma Presidente de Junta, a da Freguesia da Matança e Aguiar da Beira, na Freguesia de Forninhos. Aplaudo a escolha da Presidente da Assembleia Municipal de Fornos de Algodres, poucas haverá no nosso país.
Ter voz é ser empreendedora, e todas nós temos a maior arma para nos impormos contra os padrões da sociedade, temos voz para apelar a todas as mulheres a crença nelas próprias, na força e no poder que pensam não ter. Temos voz para reagir quando, por exemplo, o Presidente da República disse à Ministra Ana Abrunhosa: “Este é um dia super feliz, mas há dias super infelizes. E verdadeiramente super infeliz para si será o dia em que eu descubra que a taxa de execução dos fundos europeus não é aquela que eu acho que deve ser. Nesse caso, não lhe perdoo. Espero que esse dia não chegue. Mas estarei atento para o caso de chegar.” Teria proferido este discurso se fosse um ministro homem?! Perdoar?! São momentos como este que não podemos deixar passar, para que não se repitam. O valor mais importante para as mulheres e, no qual assentam todos os outros, é o do respeito.
Assim, concluo, que o texto já vai longo, com um aplauso de pé para todas as mulheres empreendedoras, fazedoras de vontades e vozes ativas na sociedade.
Sandra Maria Pereira Correia, Docente