Mais Beiras Informação

Diretor: Paulo Menano

Opinando: “Já fomos engolidos!”, de Carlos M. B. Geraldes ,


Já fomos engolidos!

 

«Tudo o que resta é a possibilidade de comunicação»

Capitão Jean-Luc Picard, Star trek

O canal está aberto para o espaço sideral, as fronteiras estão a desaparecer, as boas ideias estão a ser banalizadas e a sua importância insignificante. Andámos à deriva entre terras sintéticas e orgânicas, virtual e real, informação e distração. As estruturas sociais como as conhecemos estão a modificar-se, a desmaterializar-se, o tapete está-nos a ser retirado enquanto os sistemas de mudança se dissipam; os Césares são outros e o navegar nas vagas das páginas da internet ou em usar aplicações( apps )para realizar tarefas é destino!

Comunicação sideral? Melhor pílula não há para nos transformar a mente e a perceção com que olhamos uma realidade que está a deixar de existir! O horizonte, para além de assentar numa interrogação que repudiamos, após sermos cartografados na nossa passada terrena, ainda se canta, em glória, hossanas por sermos acondicionados, de túnica branca, na finitude de um “datacenter” como um reino vindouro/espiritual. É uma nova configuração do mundo: local onde se explora o poder bruto do irracional humano. É a cultura hipertecnológica e cínica, autossuficiente, sem perturbações, livre de emoções, descrente da sinceridade e da honestidade humana, do nosso tempo que nos transformou num vulgar enxame de abelhas sem conhecermos as intenções de quem domina! É onde se bale como uma ovelha e se vive como uma estrela cinematográfica em que o firmamento expatriou, para segundo plano, os velhos fantasmas e as saudades metafísicas que nunca desaparecerão totalmente.

Comunicação, extracção, dominação e exploração do sujeito é o recurso natural de um novo mundo:tudo se direcciona para que os pensamentos, palavras e ações se transformem em comportamentos mecanizados, como se vivesse numa linha de montagem negadora do sentido da experiência. O controlo sobre si pelo invisível é total! O paraíso revela-se nas suas perpétuas promessas de liberdade, prosperidade, ausência de doenças, miséria e de consumo.

É a cultura do blip – som que imita a coisa significada –  na ponta dos dedos. Informação, mentes elétricas, dados ilimitados, precisões, mercadorias, negócios, bibliotecas, sonhos, tagarelices, Pai Natal em cuecas, Mãe Natal em lingerie e etc, etc. Assim,tudo serve para codificar o nosso pensamento e um outro logos / verbo está no mundo: o híbrido, o homem comunicador digital foi fabricado.

O interface entre o eu, o outro e o mundo já está reprogramado. Agora, imagine quando a realidade holográfico estiver à mão de semear?! Até dará pinotes, acompanhados de aleluias, por não distinguirmos uma torradeira da massa encefálica!

Os alicerces de uma nova construção social da realidade já são um facto.

Já fomos engolidos! Como se o deus “Hipnos,” que na mitologia grega personifica o sono e a sonolência, mas não do cansaço no que diz respeito aos likes, nos enjaulasse num grande palácio cibernético, construído dentro de uma grande caverna, onde o sol nunca se alcança e nem se chega a poder tocar-se na pessoa ou na coisa que está à frente.

Comunicamos sem sermos capazes de pilotar. O galo deixou de cantar para acordar, os cães de ladrar, os gatos incapazes de miar. A morada onde se vive passou a ser acanhada, transformada num rio de esquecimento ante cortinas de dados e sons de flauta que “Morfeu” tem o cuidado em manter para que a mente humana tenha asas para voar pelos dispositivos comunicacionais em tranquilidade, em paz e silêncio.

A tecnologia e a informação são o novo encanto da humanidade. Ela tudo tem: feitiço, fantasmas; alma, espírito, voos transcendentes; imaterialidade, sexo, experiências ocultas, ignorância da melhor; estupidez sem horizonte, fantasias banais, “nudes à la carte”; guerras, discos voadores e seres de outro mundo a pairarem à mão de semear;vidência, cruzadas de coaching; influencers psicadélicos com favores cósmicos; religiosos interplanetários, ecologistas de telescreen – é todo um mundo labiríntico de esperança que nos abastece e alimenta a nossa massa encefálica de 1,5 kg, com a capacidade de arquivar o equivalente a 1.000 terabytes de informações e estabelecer mais conexões cerebrais do que o número de estrelas existentes na nossa galáxia!!!

Tudo o que resta é acelerar a velocidade dos impulsos eléctricos de modo a que a possibilidade de comunicação não seja o lugar onde se perde a alma, a gratificação da vida, da comunidade e do local onde nascemos.

A si, prezado leitor do MaisBeirasInformação, desejo-lhe um bem-aventurado Natal e para 2023 um vibrante: Ho! ho! ho!

 

 

 

Carlos M.B. Geraldes, PhD