Aja agora! Ameaças à liberdade de expressão numa sociedade “livre”
Enid Blyton, conhecida pela criação de Os Cinco, livros de mistério e aventura, para crianças, e do personagem infantil Noddy, tem sido alvo, com outros escritores, de um ataque vil por um grupo cuja mentalidade é uma lembrança do agir Talibã: conjunto de pessoas representa um fenómeno emergente no mundo ocidental, afirmando ser proponentes da democracia enquanto se opõe ao pluralismo e a qualquer pensamento que não esteja alinhado com as suas próprias crenças. Este bando, de mente fechada, possui uma visão de mundo que não é apenas carente de luz e esclarecimento, mas também regressiva, maligna, obscurantista, restritiva e intolerante com a expressão cultural e os direitos das liberdades individuais.
A situação é alarmante: bibliotecas em Devon, Reino Unido, estão a ser obrigadas a ocultar as versões originais dos livros de Enid Blyton, enquanto clássicos são submetidos a purgas de palavras. O mais surpreendente, no entanto, é que os cidadãos comuns parecem não se revoltar contra essa censura aberta, que representa uma verdadeira ameaça à liberdade de escolha e ao pensamento crítico.
A pressão é crescente pelo controlo e monopolização do pensamento, já não é segredo que os nossos direitos são corroídos e as nossas vozes; estão a ser silenciadas. Num mundo cada vez mais polarizado, controlado por governos autoritários e corporações poderosas, a liberdade de pensamento e a preservação do conhecimento são fundamentais para garantir uma sociedade justa e democrática.
Ray Bradbury, no livro Fahrenheit 451, para além de nos alertar, destaca os perigos da censura e da proibição de livros, mostrando como a abolição do pensamento crítico pode levar a uma sociedade empobrecida e superficial.
Qualquer dia, os livros poderão ser proibidos por serem vistos como perigosos para a ordem social e a estabilidade dos interesses instalados de um agir ocidental pró talibã. O que ocorreu com os livros d’Os Cinco e com a personagem infantil Noddy é um exemplo de como a censura é usada como uma ferramenta para limitar o acesso à informação e ao livre pensamento, o que pode levar à escassez de diversidade de ideias e perspetivas. A valorização da conformidade e da uniformidade é vista como uma forma de promover um rebanho de pessoas sem vontade própria, eficiência e produtividade, anulando o poder de criatividade e diversidade de pensamento. Aí, resistir à censura é assumir um papel crucial na defesa da democracia e da cultura literária.
Estes movimentos querem por fim a preservação do conhecimento e do livre pensamento, crucial para se garantir a diversidade de ideias e as perspetivas numa sociedade democrática. Quando o acesso à informação é limitado, as pessoas passam a viver nas trevas, dado a censura ser usada para silenciar vozes dissidentes e impedir o debate saudável e construtivo de ideias, o que pode levar à polarização e ao conflito social. Logo, a censura impede a liberdade de expressão e os direitos humanos, como a liberdade de imprensa e de religião.
A preservação do conhecimento produzido pelo ser humano, independentemente da sua linha temporal, deve ser de livre acesso, para garantir a diversidade de ideias e perspetivas, e permitir que a sociedade se adapte às mudanças constantes, ajudando a tornar-nos seres humanos tolerantes, benevolentes e de genuína boa vontade.
É fundamental que nos posicionemos contrários a qualquer tentativa de configurar estes tempos sob o princípio da negação ao pensamento registado. Esta atitude é uma forma de censura que representa a verdadeira ameaça à liberdade de escolha e ao pensamento crítico. A remoção de livros considerados ofensivos, perigosos ou que vão contra os valores governamentais ou da sociedade em que vivemos não pode ser utilizada para impedir ou restringir a divulgação de ideias. É crucial que a censura não seja aplicada por governos, escolas, universidades ou qualquer outro poder vigente.
Os livros não podem ser reduzidos/condenados a uma mera substituição de palavras para controlar a informação disponível para as pessoas. Não devemos incentivar esta agenda maléfica para limitar o acesso à informação. A inclusão humana não se faz com a remoção de património cultural, escondendo livros, palavras, removendo conteúdos, mas sim com atos humanos de boa vontade e valores transe-subjetivos alicerçados na pluralidade da dignidade humana. A preservação do conhecimento e do livre pensamento é fundamental para garantir uma sociedade justa e democrática, onde a diversidade de ideias e as perspetivas individuais sejam valorizadas e respeitadas.
Inclusão faz-se mudando o agir humano: se a pessoa pode praticar o bem em comunidade, porque escolhe o mal?
Devemos lutar para garantir a liberdade de expressão e o acesso à informação em todo o mundo, para podermos construir um futuro mais justo e equitativo para todos. Porque, se o presente impulso de agir se estender, com a destruição sistemática da cultura, como estátuas, bibliotecas, obras de arte e perseguição de quem pensa, não só suprimirá a diversidade cultural e religiosa, como também aumentará a intolerância, a escuridão, a ignorância e a visão distorcida da história, promovida pelos próprios para exaltar os seus desarranjos mentais.
Posto isto, será que devemos fugir como Damáscio, filósofo grego que viveu no século V d.C., um dos últimos membros da Academia de Platão, em Atenas, por se opor às perseguições do imperador cristão Justiniano I, um infligidor e percursor da idade das trevas, e pedir exílio para um lugar onde haja vida livre e diversidade cultural?
Carlos M.B. Geraldes, PhD