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Diretor: Paulo Menano

Carta Aberta ao Ministro da Educação – Sergio Mendes


Carta Aberta ao Ministro da Educação

Caro João Costa

 

No passado dia 14 de janeiro fui um dos 100 mil professores que se uniram para afirmar: Basta, exigimos respeito! Éramos 150 da Beira Interior. Os 3 autocarros que seguiram da Beira Interior cruzaram-se com centenas de veículos que seguiam no mesmo sentido… que não é o seu. Estamos, provavelmente, todos errados. A excessiva dedicação aos aspectos supérfluos da educação impediu-nos de ouvir as últimas declarações, conferências de imprensa e entrevistas do sr. Ministro. Só quer APROXIMAR, FIXAR E VINCULAR os professores. Aliás, tem feito tudo por isso. No ano passado renovou todos os contratos anuais e este ano prepara-se para vincular mais de 10 mil docentes. Como somos ingratos sr Ministro?! O nosso muito obrigado por tudo o que tem feito por nós, do fundo do coração.

Chamo-me Sérgio Mendes. Sou apenas um número para o Ministério da Educação. Um entre muitos… Sou casado e tenho três filhas menores. Resido no Fundão e dou aulas em Alter do Chão. Graças à sua epifania do ano passado, em vez de 50, continuo a realizar diariamente 260 km (Fundão – Alter do Chão – Fundão). Este ano, por via da norma-travão, irei vincular. Por conseguinte tinha a real expectativa de me aproximar de casa. Será? Não me parece… O massivo processo de vinculação que propõe não está associado a um concurso nacional de forma imediata. Significa que, mais uma vez, terei de adiar este sonho. Estarão na mesma situação os 3 colegas que partilham boleias comigo. Curiosamente um é QE, outro QZP e outro é contratado. Se o sr Ministro não tiver uma nova epifania, todos nós poderemos concorrer daqui a dois anos aos novos QZP, alguns deles mais próximos de casa. Mas, ao fazê-lo estamos a aceitar: i) a possibilidade de poder dar aulas, em dias alternados, em escolas que distam entre si cerca de 50 km; ii) a obrigatoriedade de ter de concorrer para o QZP onde se encontra a escola onde leciono. Assim, graças à bondade da sua proposta, corro o risco de, daqui a dois, deixar de poder partilhar boleias porque tenho de dar aulas em Avis, Alter do Chão, Ponte de Sor ou no Gavião. A proposta é simples: realizar 360 km diários ou separar-me da família. A sua proposta é o paradigma de quem procura mostrar que quer NEGOCIAR, VINCULAR e APROXIMAR quando, na realidade, está a LUDIBRIAR, APRISIONAR, para depois POUPAR com a classe docente.

Talvez não saiba mas, além de professor, sou político… Sou vereador de uma autarquia do interior, eleito pelas listas do Partido Socialista. Sou daqueles que acredita que o Estado é uma pessoa de bem e compete aos políticos cuidar da “res publica”. Defendo, por isso, que observar a realidade e tomar decisões baseando-nos também em variáveis que não estão em folhas de Excel. Se fosse um político do aparelho dar-lhe-ia os meus parabéns. A sua proposta para a educação é brilhante a curto / médio prazo. Consegue dividir uma classe ao mesmo tempo que a prende a falsas expectativas. Por outro lado, garante que os alunos tenham o tempo preenchido, nem que seja com profissionais desmotivados… por terem sido enganados. É este o agradecimento por todo o esforço colectivo realizado durante a crise económica e o período pandémico. Pouco importa a qualidade da educação, desde que os pais não tenham que se preocupar com os seus filhos e… os custos do Ministério da Educação não ameacem a sustentabilidade económica que permite financiar a banca portuguesa ou empresas como a TAP.… mas não sou político de carreira!

É por isso que, como pai, professor e político lhe peço: deixe-se de epifanias. Não invente: 1) Devolva o tempo de serviço que pertence aos professores, nem que seja de forma gradual; 2) Proceda a um concurso nacional, já este ano, para os QZP e Contratados (e QE que queiram mudar de escola) tendo como único elemento o factor graduação profissional; 3) Proceda à vinculação dos professores da norma/travão e do número de professores que prevê vincular na sua proposta, baseando-se em critérios assente na graduação profissional e na existência de um vínculo com a função pública este ano; 4) Aplique o modelo de contratação / vinculação que preconiza para daqui a dois anos, somente para quem pretenda aceitar as condições por si propostas.

Na política, como na educação, não há que inventar: basta falar de forma simples, clara e transparente.

Sergio Mendes