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Diretor: Paulo Menano

Opinando: “Teletrabalho e semana de 4 dias (de trabalho)”, de Daniel Felizardo


Teletrabalho e semana de 4 dias (de trabalho)

O Código do Trabalho define teletrabalho como uma “prestação de trabalho em regime de subordinação jurídica do trabalhador a um empregador, em local não determinado por este, através do recurso a tecnologias de informação e comunicação” (A Lei 83/2021, de 6 de dezembro, alterou pela 17.ª vez o Código do Trabalho, estabelecendo, particularmente nos artigos 165.º a 171.º, o novo regime jurídico do teletrabalho, em vigor a partir a 1 de janeiro de 2022). Pode ser desempenhado por quem fizesse parte da empresa ou por quem acaba de ser admitido já com esse regime. Em ambos os casos, deve haver um contrato de trabalho ou um acordo escrito que funcione como aditamento ao contrato. A falta deste documento pode complicar a prova, em caso de conflito entre as partes.

«O teletrabalhador tem os mesmos direitos e deveres que os colegas com a mesma categoria ou função idêntica que se deslocam à empresa: formação, promoções e progressão na carreira, limites do período normal de trabalho, momentos de descanso, reparação de danos por acidente de trabalho ou doença profissional e não pode receber menos do que receberia em regime presencial.
O empregador, por sua vez, deve proporcionar formação adequada para as tecnologias de informação e comunicação a usar na atividade e promover contactos regulares com a empresa e os colegas, para o trabalhador não se sentir isolado. Por regra, não deverá deixar passar mais de dois meses entre cada contacto.

O trabalhador terá de comparecer a reuniões de trabalho, formação ou outras atividades que exijam presença física, desde que seja avisado com, pelo menos, 24 horas de antecedência.

Já não se suscitam quaisquer dúvidas de que o mundo do trabalho dificilmente voltará a ser igual no período pós-pandemia. Uma das áreas em que isso é notório é o teletrabalho. Ora, com o repensar das formas de trabalhar, regressou também a discussão em torno da semana de trabalho de quatro dias. Alguns países ou empresas, de forma isolada, estão a testar este modelo.

Desconhecemos ainda se estamos apenas perante uma quimera e algo reservado a um conjunto muito restrito de países ricos ou, ao invés, se será mesmo o futuro do mundo laboral.

Uma das vantagens operadas pela pandemia conduziu a que patrões e trabalhadores percebessem que não é a presença física ou o horário fixo dos colaboradores nas empresas que determina ou garante que estes cumprem as suas obrigações. Na verdade, mesmo com as pessoas ausentes dos seus escritórios, o trabalho continuou a ser feito. Gerou-se até um efeito contraproducente, em muitos casos, com inúmeros trabalhadores a assegurar que trabalhavam mais horas por dia em confinamento do que antes da pandemia.

Ademais, podemos aditar o aparecimento de temáticas que, hodiernamente, estão no foco da agenda política, social e mediática, mormente, as alterações climáticas ou a problemática da saúde mental. Com efeito, estamos perante um momento em que o desenvolvimento tecnológico dos últimos anos trouxe as ferramentas que permitem pôr em prática estes modelos de trabalho alternativos.

Ora, como consequência direta e necessária, as variáveis como a qualidade de vida dos indivíduos, o equilíbrio entre o lazer e o trabalho, o impacto ambiental ou os custos financeiros e de tempo inerentes às deslocações diárias para o trabalho, começam a ser levadas com maior seriedade. Sem desprezar os efeitos na produtividade dos trabalhadores e no seu desempenho.

É comumente aceite que não existe uma forma paradigmática de trabalhar, podendo, consoante o caso concreto, fazer sentido ter todos os trabalhadores na empresa, ter parte – ou a maioria – a trabalhar de forma remota (a partir de casa ou não), em horários fixos ou flexíveis, sem que tal comprometa, em definitivo, a produtividade e o rendimento dos colaboradores. Antes pelo contrário.
O novo modelo testado em vários países:

A semana de trabalho de quatro dias está em teste em vários países, nomeadamente na Islândia, Japão, Suécia ou Nova Zelândia.

Espanha vai aproveitar o dinheiro vindo do Fundo de Recuperação da União Europeia para um projeto-piloto de três anos para teste da redução dos dias de trabalho. Empresas como a operadora Telefónica anteciparam-se e já estão a experimentar o modelo dos quatro dias de trabalho por semana, ainda que com uma redução de salário para quem aderir.

E, no Japão, o governo está a incentivar as empresas a optarem por este novo modelo. Um dos argumentos a favor de decisões políticas favoráveis a este ‘encurtar’ da semana de trabalho está relacionado com a expectativa de que, com mais um dia de descanso, as pessoas acabem por gastar mais e, através deste aumento do consumo, impulsionar a economia.

No caso islandês, onde as primeiras experiências passaram por oferecer aos trabalhadores o mesmo salário por menos dias, os resultados parecem animadores, com relatos de um maior bem-estar dos trabalhadores e sem prejuízos para a produtividade.

No que diz respeito ao retorno para os empregadores, funcionários com excesso de trabalho tendem a ser menos produtivos, se se considerar a performance por hora de trabalho. Por outro lado, quando se olha para as estatísticas de produtividade no mundo dito desenvolvido, observa-se que alguns dos países mais produtivos, como a Noruega, a Dinamarca, a Alemanha ou os Países Baixos, trabalham em média muito menos do que em países como Portugal, Espanha, Itália, Reino Unido e muitos outros. Paradigmático é o exemplo do Japão, conhecido pelo excesso de horas de trabalho a que muitos trabalhadores são sujeitos, e que está bastante longe dos lugares de topo no ranking dos países com maior produtividade do mundo.

Para os trabalhadores, uma semana de quatro dias pode representar menos desgaste semanal e um maior equilíbrio entre o trabalho e a vida pessoal, nomeadamente familiar.

Note-se que, apesar de algumas confusões ainda existentes, o objetivo deste tipo de medidas não passa por fazer com que os indivíduos trabalhem nesses quatro dias as horas que trabalhavam numa semana de cinco dias, até porque tal seria contraproducente. O que se espera é que o aumento da satisfação no trabalho, a capacidade de recuperar melhor nos dias de descanso e o menor stress vivido se traduzam em ganhos de produtividade, de empenho e de compromisso com a empresa, traduzindo-se num ganho para trabalhadores e patrões.

Um outro tema ligado à questão das semanas de quatro dias de trabalho está relacionado com o voraz desenvolvimento tecnológico dos últimos anos, nomeadamente em termos de inteligência artificial. Se, por um lado, traz as ferramentas para os tais novos modelos de trabalho, também tende a gerar excedentes de trabalhadores, para os quais há que arranjar soluções. Uma menor carga horária por semana poderá fazer parte da resposta.

E em Portugal:
Ainda não é claro quando tal medida poderá ser uma realidade. Os críticos das semanas de quatro dias alegam que, dado o défice de produtividade português face a muitos congéneres europeus, reduzir a semana de trabalho significaria comprometer ainda mais qualquer tentativa de reverter este gap. Por outro lado, não é consensual se o efeito sobre a produtividade é forçosamente negativo ou positivo, já que há quem defenda que uma semana mais reduzida pode favorecer uma melhor performance dos trabalhadores nos tais quatro dias de trabalho.

Uma vez que há, por ora, pouco histórico dos resultados deste tipo de soluções, existe um longo caminho ainda a percorrer, nomeadamente para perceber se este será, de facto, um luxo para alguns ou algo que faz sentido em diferentes contextos, caso se confirmem os benefícios de produtividade».

Bibliografia: Código do Trabalho, «Do RBI à semana de 4 dias, as propostas experimentais dos partidos», Isabel Patrício, «O novo regime do teletrabalho», moneris.pt, «Regras e Direitos para o Teletrabalho», DecoProteste.

 

Daniel Felizardo, Advogado, Sócio
e Presidente da Assembleia Geral da Giro HC Associação Pessoas Com Diabetes Do Distrito de Viseu