
OPINANDO: Ser árbitro em Portugal, quando o Código Postal também conta!
Ser árbitro no Interior de Portugal não é fácil. A carência de meios, de recursos, de conhecimento, de visão e de estratégia tornam ainda mais
difícil e exigente a progressão e a afirmação dos árbitros desta localização no panorama da Arbitragem Nacional. Os factos e a história provam-no,
muito mais do que as palavras.
Luís Máximo, árbitro dos quadros da FPF filiado na AFCB
A foto que ilustra este artigo é referente ao curso de árbitros de futebol e de futsal 2012/2013 promovido peça AF Castelo Branco. Ela é um exemplo vivo — e simbólico — da realidade da arbitragem de base e, principalmente, de que o talento isolado raramente basta; o ambiente onde ele se desenvolve é muitas vezes o fator decisivo. Dos cerca de 20 candidatos apenas foi possível reter cerca de 15%. Dos três elementos que alcançaram os quadros nacionais, apenas um é filiado na AFCB. O mesmo tem alternado entre a presença nos quadros distritais e na segunda metade da tabela classificativa dos quadros nacionais mais baixos. Os outros dois elementos solicitaram transferência para a AF Lisboa por razões de ordem profissional. Um deles, o nº19, chama-se
Luís Filipe. De acordo com o Comunicado Oficial 943 da FPF, de 12/06/2025, acaba de ser promovido à 1ª categoria nacional depois de ser o primeiro classificado no quadro nacional de C2. No mesmo documento é possível identificar outro elemento nas mesmas circunstâncias. Trata-se de Vera Esteves, árbitra que frequentou o curso na AFCB poucos anos antes do Luís Filipe e que acaba de ser promovida à 1ª categoria nacional do Futebol Feminino após ter alcançado o 2º lugar no quadro de C2 feminino. Fê-lo integrando os quadros da AF Coimbra para onde se transferiu também por razões de ordem profissional.
Estes percursos confirmam, de forma quase empírica, uma realidade facilmente verificável. Os árbitros oriundos do litoral, especialmente dos grandes centros urbanos, apresentam os melhores resultados classificativos. De facto, apesar de algumas honrosas exceções, 1 os árbitros filiados na AF Castelo Branco voltaram a posicionar-se, maioritariamente, na segunda metade da tabela. Esta tendência tem sido uma constante entre os árbitros filados (não confundir com oriundos) em AF do interior do país.
A tese de doutoramento “A excelência na arbitragem: o papel das instituições educativas e desportivas”, defendida na UBI em 2021, identificou causas estruturais que ajudam a explicar esta disparidade. O contexto é uma delas. Os resultados deste estudo indicaram que a experiência como árbitro tem um efeito direto na classificação de 11% e a origem geográfica dos árbitros influiu
em 5%. Estes dados sugerem que a integração num quadro de árbitro de uma Associação de Futebol com maior densidade populacional garante o acesso a mais recursos e oportunidades de desenvolvimento. De facto, a probabilidade de um árbitro filiado nestas associações se cruzar com pares dos quadros nacionais e, principalmente, da primeira divisão aumenta em 4%. A convivência com elementos mais experientes e competentes favorece a aprendizagem informal, potencia a promoção de um ambiente onde o erro é uma oportunidade de aprendizagem e a exposição a contextos mais exigentes. Acresce que a experiência de jogo acumulada de um árbitro dos quadros de uma grande metrópole é muito maior do que a de um elemento do interior. Mais do que números, este estudo expôs padrões de oportunidade e desigualdade que moldam as trajetórias dos árbitros no país e contribuiu para areflexão sobre a formação e desenvolvimento dos árbitros.
Paulo Afonso (C4 – Futebol) conseguiu a subida de divisão; Luís Máximo (C3– Futebol) e António Nabinho (C3 – Futsal) obtiveram uma classificação muito próxima da promoção de categoria
Artigo de opinião de Sérgio Mendes